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25 abril 2012

Para amolecer o mais duro coração capitalista!


Livro: Germinal
Autor: Émile Zola (1840 - 1902)
Editora: Abril Cultural - 1979
Páginas: 535

Nesta minha caminhada na eterna e árdua labuta acadêmica como estudante de filosofia na Universidade Estadual do Ceará, já fui exposto a inúmeras manifestações ideológicas e literárias. 

A maioria destes tem uma grande carga de ideologia esquerdista. Alguns tão fervorosos que, por um segundo, parece que você está vivendo na clandestinidade como defensor do comunismo na ditadura da década de setenta aqui no Brasil.

Por incrível que pareça, mesmo cursando filosofia, vez por outra dou uma pulada de cerca para adulterar com a sociologia. Aprecio bastante as obras de Marx e Durkheim. Principalmente Durkheim.

Obviamente, quando li Marx, olhei o texto com a mente contextualizada a todas as circunstâncias em torno daquele conturbado final de século IXX. Diante do caos e exploração que ocorria naquela época, afirmo que a obra e pensamento de Marx foi necessário como protesto à desumana exploração e animalização que a revolução industrial estava fazendo com boa parcela dos trabalhadores.

Apesar de achar bastante infantil a postura quase religiosa que alguns grupos de esquerda leem (e por vezes até acham que pratica) os textos de Marx, creio que seu protesto pode sim ecoar em algumas categorias nas relações de trabalho hoje. 

Pena que, a meu ver, as posturas de plano de ação das manifestações de esquerda fracassam vergonhosamente ao não adaptar o discurso ao nosso contexto. 

Enfim, apesar de ter gostado muito dos textos destes distintos sociólogos, nenhum deles conseguiu me tocar tão profundamente como esse romance de Émile Zola.

Émile Zola

Ao contrário de uma tese acadêmica que, para ter credibilidade técnica, têm-se que manter um certo distanciamento para que a análise seja embasada apenas em fatos e estatísticas; Germinal é uma lente da qual o leitor é levado para as mais profundas entranhas do que era ser um trabalhador assalariado, ralando numa mina de carvão, naquele tempo de revolução industrial à todo vapor.

Definitivamente este é, sem dúvida, o poder do romance. Pois é impossível o leitor não se sentir na pele destes mineiros dia-a-dia adentrando na escuridão da terra. Todos eram tragados pela mina! Mulheres, crianças, idosos, trabalhando por horas a fio, por uma migalha de salário, numa era onde não havia sindicatos, nem plano de saúde, nem dignidade, nem esperança, nem nada.

A autor, para construir esta visceral narrativa naturalista, passou um período trabalhando numa mina no interior da França (exatamente o contexto dos personagens do livro), vivenciando o difícil destino de toda uma massa humana esquecida pelo estado e por Deus.

Saindo das tripas da terra depois de um longo expediente
Final do século IXX


Zola criou personagens inesquecíveis, cheios de personalidade e humanidade. Exprimindo esse estado de ser humano nos extremos; da mais suja bestialidade, a mais sublime cordialidade. Está tudo ali, o homem retratado com todo seu paradoxo. 

Voltando ao que estava discorrendo no começo desta resenha. Falei sobre os sociólogos e aquele papo de esquerda só para dizer que nenhum discurso de cunho ideológico conseguiu chegar sequer perto do impacto que foi o livro Germinal na minha alma.

Acredito que Émile Zola realmente escolheu o melhor caminho para nos transmitir tudo aquilo que estava no âmago de sua indignação por conta daquela realidade sub-humana. E assim, ao invés de páginas e páginas de teorias, agarrou o leitor pelos cabelos e o levou a intimidade dos mineiros. Usando esta matéria prima teceu um dos maiores e mais comoventes romances de todos os tempos. E impactou e conscientizou várias gerações. 

Inclusive a mim, um capitalistazinho vendido leitor de Veja.