Artista: Ryan Adams
Álbum: Gold
Ano: 2001
Gravadora: Lost Highway / Universal Music
Mês passado foi relembrado os onze anos dos terríveis ataques terroristas ocorridos nos EUA em 11 de setembro de 2001. Um deles, o do Word Trade Center, foi o visualmente mais marcante, pois o mundo todo acompanhou as duas torres gêmeas (símbolos do orgulho americano e centro de boa parte da economia nacional) virarem cinzas, deixando os novaiorquinos e todo o mundo estarrecidos com tamanha atrocidade.
Foi em meio a esse caos que, em 25 de setembro de 2001, Ryan Adams lança seu clássico, Gold, com uma capa que realmente demostra como estava os EUA naquele período: de cabeça pra baixo!
Porém, Ryan Adams (que reza a lenda é capaz de compor até nove músicas por dia) é alguém que, como ninguém, consegue transpor toda sua dor em canções excelentes!
Depois de destruir o coração de meio mundo com seu primeiro álbum (Heartbreaker - 2000), ele entra no panteão dos queridinhos da crítica especializada com esse segundo disco que o faz estar na lista dos grandes do country alternativo junto com Wilco, Gilliam Welch e Lucinda Williams. E Gold é uma excelente amostra de como Ryan é versátil em passear por vários gêneros, sempre mantendo ao fundo sua maior referência, o folk.
O disco começa com a alegre e amarga "New York, New York", que acabou tornando-se um verdadeiro hino na volta da alta-estima da cidade após os ataques do 11 de setembro. Hell, I still love you, New York. O clipe dessa canção foi gravada a exatos três dias antes dos ataques.
Com "Firecracker" a gaita come solta! Com direito a back vocal de Adam Duritz, vocalista do Couting Crows, que aliás participa de várias faixas.
Há momentos tristes e belos, como a doce homenagem de Ryan a linda poetiza suicida "SYLVIA PLATH", escrito desta forma mesmo, em letras garrafais. Enfim, ao que parece, depois da dor de algumas decepções amorosas, neste álbum ele se entrega em muita de suas letras naquela melancolia da fase de se reerguer, de cantar para si mesmo canções que abordam o sofrimento sem aquela auto-piedade de Heartbreaker. O que combinou perfeitamente ao espírito melancólico, porém ainda com esperanças, da nação americana àquela época.
Enfim, começando em Nova York e terminando em Hollywood, Ryan passeia por muitas estradas. Por folks arrazadores ("Somehow, Someday", "Gonna make you love me"), blues corta-pulso de primeira ("The rascue blues", "Touch, Fell & Lose"), rocks raivosos ("Enemy Fire", "Tina Toledo's Street Walkin' Blues") e baladas de fazer chorar o mais duro dos corações ("When the Stars Go Blue", "Nobody Girl", "Wild Flowers"), terminando sua jornada na solitária Hollywood de "Goodnight, Hollywood Blvd".
Poucos artistas como Ryan conseguem temperar suas músicas com tristeza na medida certa. A ponto de tornar o sofrimento na mais sensível doçura. Gosto muito de sua musicalidade, de suas construções de melodias, de sua voz rouca que consegue se adequar nas mais variadas formas.
"Com Gold, eu estava tentando provar algo para mim mesmo. Queria inventar um clássico moderno." - Ryan Adams
Depois de Gold, fértil como só ele, o queridinho do alt-country lançou muitos álbuns, numa linha tão irregular quanto Neil Young, levando a crítica e os fãs por vezes do céu ao inferno. E pretendo futuramente poder ter o privilégio de conversar com vocês sobre todos eles!
Assim como Nova York, Ryan Adams conseguiu se reerguer depois de um longo período de drogas, decepções amorosas e grandes perdas (como a morte do baixista do The Cardinals, sua tradicional banda de apoio). Hoje Ryan é um homem casado que largou qualquer tipo de substâncias lícitas e ilícitas. Está com mais maturidade, sobriedade e serenidade e, da mesma forma, criando músicas que são verdadeiros feedback's de seu interior.
Aqui no Brasil ele ainda é um ilustre desconhecido. Eu mesmo o conheci através do Gold, e passei a aprofundar meus conhecimentos sobre ele através da minha ex-namorada Nathalia, que por coincidência é uma das maiores autoridades no quesito Ryan Adams deste país.
Então, para os marinheiros de primeira viagem na musicalidade do Ryan, eu realmente indico este disco que, apesar de longo, de forma alguma enjoa. Você escuta ele de cabo à rabo, e é tão bom que parece que o disco tem 15 minutos! Uma verdadeira viagem sonora pelas longas estradas, bares e corações partidos dos EUA. Basicamente um clássico moderno!
A PREDILETA:
Reza a lenda que certa vez Ryan entrou numa loja de eletrodomésticos para comprar uma TV, e quando estava no caixa começou a rolar em inúmeras telas a imagem do show do The Corrs, que junto com Bono Vox cantavam "When the Stars Go Blue", no que ele olhou pro cara do caixa e disse:
- Ei, tá vendo essa música? Ela é minha!
- Ei, tá vendo essa música? Ela é minha!
No que o caixa indiferente respondeu:
- Whatever!
- Whatever!
Sacanagem né? Pois é, vou confessar que meu pecado foi adquirir o Gold por conta desta canção. Gosto muito dela! Escutei ela várias vezes nas minhas madrugadas de plena insônia. Ela foi trilha sonora de muitas das vezes em que vi o dia amanhecendo. Botava essa canção pra tocar na vinda da alvorada, e observava a claridade chegando e as estrelas sendo ofuscadas com a luz do sol.
Há muita beleza na tristeza e melancolia. Ela te faz repensar sobre a vida, seus valores, seu olhar diante do mundo. Não é a toa que a própria Bíblia reconhece esse estranho aspecto:
"É melhor ir a uma casa onde há luto do que ir a uma casa onde há festa, pois onde há luto lembramos que um dia também vamos morrer. E os vivos nunca devem esquecer isso. A tristeza é melhor do que o riso; pois a tristeza faz o rosto ficar abatido, mas torna o coração compreensivo. Quem só pensa em se divertir é tolo; quem é sábio pensa também na morte."
Eclesiastes 7. 2-4
Eclesiastes 7. 2-4
E é exatamente nesta perspectiva da morte que o homem se torna eterno através da arte. Mas isso já é uma outra conversa...
Confira no vídeo abaixo a música "When The Stars Go Blue":